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*Assholes - Peter Vack* (DVD)

 Num dos seus ensaios, Susan Sontag descreve a sensibilidade ao "camp" como uma espécie de amor, um amor pela natureza humana. Cita-se: "It relishes, rather than judges, the little triumphs and awkward intensities of character.....Camp taste identifies with what is enjoying. People who share this sensibility are not laughing at the thing they label as "a camp", they are enjoying it. CAMP IS A TENDER FEELING"

Aqui aplicado ao cinema, é com essa ternura e vontade de ser sempre surpreendida/o que nos arriscamos a ver um clássico de culto realizado antes de sequer termos nascido, como um da nossa contemporaneidade que pode ser vilipendiado no agora mas que se tornará um clássico daqui a uns anos. É com esse profundo entusiasmo e quasi inocência que nos sentamos e deixamos o sentimento do camp tornar possível a nossa evasão durante umas horas. 

ASSHOLES inspira tão só a ternura quanto a que a/o espectador/a quiser dispensar. A narrativa é surreal de um realismo mágico marginal, pontuada por humor escatológico e juvenil e o seu movimento mais subversivo é o de ter um final feliz. 

Notam-se inspirações e influências como a cinematografia de John Waters e Nick Zedd, um cinema transgressivo com momentos "duros de ver". A selva urbana é um cenário apetecível para o ennui das personagens, e a subsequente revolta das mesmas em que desfragmentam o seu quotidiano e vivem à margem dos limites, sustentadas apenas pela dita "lust for life" que neste filme em específico se traduz em poppers e amor heterossexual romântico. 

Narrativamente impera a anarquia desprovida de academismos e metafóras complicadas. A história centra-se em duas pessoas que se conhecem porque frequentam o mesmo psicoanalista e embarcam numa "folie a deux" que aliena a já alienada família de uma das personagens. 

Além do seu amor romântico inflamado, consomem poppers, uma substância críptica apelidada de Charge, cujo slogan é "Do whatever the fuck you want", um bocado como o dá-te asas, mas neste caso dá-te tudo e mais alguma coisa, como por exemplo, dar à luz um demónio que é uma velhinha que se apresenta como sendo o clássico Mefistófeles, mas que os nossos heróis decidem chamar carinhosamente "Mephy" e formado esse trio satânico-dadaísta-drogado só podemos esperar mais catástrofes. 

ASSHOLES é um filme "frito" e como todos os filmes deste género deve ser considerado no patamar do transgressivo e como tal, não poderá agradar a toda a gente, mas creio que deve agradar a fãs do período mais "sem limites" de John Waters e do género de cinema que usa o choque e o humor negro como principais ferramentas para dar umas ferroadas nos conceitos morais da/o espectadora/espectador.

Foi com imensa ternura que vi uma das melhores comédias rômanticas da minha existência em que :

- Duas pessoas decidem em primeira instância começar uma relação estável porque apanham herpes um do outro

- Vomitam em sincronia num desconfortável mas rotineiro jantar de família

ASSHOLES se agradar, vai ser acarinhado 

se não agradar, vai ser odiado

E estará tudo bem. É assim a arte, a subjectividade e viva o cinema independente e de culto. 









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